Wednesday, January 20, 2010

Ajuda vs blabla

Nao ha duvida que é facil criticarmos a forma como a ajuda humanitaria e a resposta internacional (nao) esta a chegar ao Haiti. Para quem està de fora e olha para o contexto parece quase inacreditavel que haja um montao de médicos, enfermeiros, engenheiros e pessoal humanitario todos bem alimentadinhos nas suas tendas xpto sem nada para fazer dentro do perimetro do aeroporto de Port-au-Prince. Os jornalista explicam: Nao ha segurança, logo a ajuda nao consegue sair sem ser com protecçao armada. Como hà poucos soldados disponiveis a ajuda ali fica paradinha à espera, enquanto as pessoas deseperadas tentam encontrar filhos e irmaos, comida, àgua, medicamentos que lhes permita sobreviver mais um dia.

Da pouca experiencia que tenho posso dizer que distribuir comida em "non-secured context" é perigoso e pouco eficaz. Quando abri um pacote de bolachas em frente a um grupo de 15 crianças afegas atiraram-se a mim e umas às outras para conseguir uma bolacha. Num abrir e fechar de olhos jà nao havia bolachas. As crianças mais fortes conseguiram tirar 5 ou 6 bolachas, as mais pequenas e menos fortes, nem sequer lhe sentiram o gostinho. Foi injusto, haviam cerca de 20 bolachas, dava para todos, mas os mais fortes encheram a pança a dobrar.

Os saques aos supermercados sao feitos por grupos armados que mais tarde vendem a comida à populaçao capaz de pagar por ela. Imagino que muitos dos caixotes de mantimentos enviados do ceu pelos helicopteros americanos foram resgatados por grupos armados que depois irao vender a comida às familias esfomedas. Nao ha numero suficiente de homens no terreno para garantir esta distribuiçao de alimentos e penso que mais vale chegar algo là que nada de nada. Que venha do ar, que seja por saque. nao é perfeito mas ajuda alguma coisa.

Percebe-se que é dificil coordenar a ajuda alimentar neste contexto. Mas e a outra ajuda? O que os impede de montar campos de refugiados com tendas? O que impede de transportar mulheres e crianças para locais seguros fora do Haiti? Afinal a 50 klm està a Republica Dominicana bem segura, podem montar campos por là. A 100 Klm està Guantanamo, também territorio seguro onde a ajuda internacional pode operar em segurança. O militares conseguem levantar campos em 2 dias. Esses campos podem pelo menos ter ajuda médica, àgua e comida. Mesmo campos dentro do territorio haitiano podem servir para registar as pessoas, trilhar quem precisa de uma ajuda médica mais profunda e que possa ser transportado para o idilio = aeroporto de Port-au-Prince. Esses campos nao seriam pilhados porque nada haveria là para roubar. Nao vi imagens dos grupos armados a atacarem os jornalistas com camaras de filmar carissimas, logo nao me parece que entrem num campo de tendas com pessoas là dentro e nada de mais.

Um médico precisa mesmo de escolta militar para avaliar quem previsa de uma amputaçao? O que impede aqueles jovens administradores da AMI ,que sairam de Portugal bem alimentados e fortes que teem as suas familias em boa saude e em segurança, de ir para o terreno e ajudar a esgravatar a terra com as suas proprias maos? O que impede aqueles jornalistas de usar os carros para transportar mortos que estao a apodrecer no meio das ruas (ainda)?

Obviamente que hà falta de coordenaçao e, mesmo depois do tsunami, a ajuda humanitaria internacional nao està pronta para reagir eficazmente a esta situaçoes. So depois desta desgraça é que provalmente se vai pensar num organisamo coordenador internacional capaz de responder à proxima (eventual) desgraça desta dimensao. Claro que o contexto de violencia nao ajuda, mas isso nao justifica esta inércia de muitos daqueles que estao ainda parados naquele aeroporto.

Vi na tv meninas de oculos de sol a dedicarem-se a uma so criança durante 4 horas, por essa crianças ser fofinha. Mas que porra: puxem as mangas e vao escavar!!!! é de louvar o trabalho dos médicos, soldados e dos experts em encontrar sobrevientes entre os destroços. Nao me parece que seja altura neste momento de enviar muitos generalistas para o Haiti. Administrativos da ONU, pessoas a fazer assessments, etc. Assessments e levantamento de necessidades sim mas feito por quem sabe fazer algo mais que somente isso. é que quanto mais gente para là vai mais àgua e alimentos sao precisos para essas mesmas pessoas. E neste momento nao me parece que convenha construir no aeroporto de Port-au-Prince um compound de luxo para expatriados que coçam o rabinho e se armam em herois enquanto o Haitianos morrem de fome.

Parece-me, posso estar enganada, que o essencial é:
1) enviar mais e mais capacetes azuis, capazes de assegurar o trabalho dos médicos e distribuiçao de alimentos mas também eles mesmo fazerem a distribuiçao dos alimentos (quanto menos expatriados nao especializados melhor! pois mais sobra para quem precisa)
2) campos com tendas que protejam os haitianos do sol abrasador, permitam registos da situaçao das pessoas com necessidades de ajuda medica especializada (amputaçoes, operaçoes, etc)
3) medicamentos com fartura para desanuviar a dor de muitos
4) Muitos, muitos, muitos peritos capazes de esgravatar os destroços. Hà crianças ali em baixo e podem estar vivas!!!
5) Por ultimo nao me parece totalmente descabido começar a procurar espaços (dentro e fora do Haiti) que sejam mais seguros para providenciar a ajuda necessaria. Nao precisam de ficar todos coladinhos no aeroporto mesmo ao lado dos saqueadores e bandidos.

3 comments:

Cris said...

É bom finalmente ler uma opinião inteligente e consistente sobre tudo isto...vê-se bem que quem está no "terreno" sabe bem melhor o que fazer, do que os políticos de secretária!

Miss quero-paz-no-mundo-e-tal said...

Obrigada pelo comment Cris. Nao sei se todo o conteudo do post serà inteligente. Mas olha jà é bom saber que hoje està ali na costa um navio (tamanho tipo porta-avioes) para tratar de casos mais graves - evita-se estar ali no meio da confusao. Hà espaço com fartura é preciso utilizà-lo!

edu said...

Nunca pensei que fosse a realidade a imitar a ficção. Imagens como esta, sobre a mais dilacerante condição humana só as tinha visto nos livros do Saramago.